Fundo de garrafa

    Enxergar nem sempre é uma tarefa simples. Os olhos nem sempre estão prontos para ver. Aos quatro anos de idade, descobri que meu jeito de olhar o mundo precisava de correção. Via tudo desfocado. Solução? Usar óculos, claro!
    Na infância, os óculos eram até interessantes. Através deles, eu via o mundo sob uma nova perspectiva e eles foram se tornando meus grandes aliados quando tomei gosto pela leitura, mas os livros é que acabaram sendo minhas lentes preferidas.
    Fui crescendo e a minha visão foi ficando cada vez mais desfocada e o peso dos óculos tornou-os um fardo para minha adolescência.
    “- Quatro olhos! Fundo de garrafa!”
     Ah! Esses apelidos de mal gosto aumentavam ainda mais a minha frustração em ser míope!
    Com o passar do tempo, já saindo da minha adolescência, eu decidi fazer as pazes como os meus óculos, escolhi aceitá-los e aceitar-me, viramos bons amigos! Afinal, como diz aquele ditado: “Não pode com eles, junte-se a eles!”. Ainda bem que fiz essa escolha, sentir-se bem consigo mesma é uma das melhores coisas da vida!
    Mas, para minha surpresa, um daqueles apelidinhos chatos da minha adolescência resolve voltar e afrontar-me!
    Um aluno meu, (sim, sou professora de Língua portuguesa), não gostando de ser repreendido por atrapalhar a aula, tenta me atingir com: “-Fundo de garrafa!!!”.
    Olhei-o com o olhar de quem permaneceu com a mesma tranquilidade com que o havia repreendido. Meu olhar foi límpido e significativo. Ele envergonhou-se, pediu-me desculpas, aceitei-as.

    Nesse dia, eu confirmei a paz que trago em mim por aceitar-me como sou, e ele? Bem, ele deve ter entendido que a ofensa revela a falta de paz que há na alma do ofensor.
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1 Comments
  • Marília Rocha.
    Marília Rocha. 12 de outubro de 2021 às 14:00

    "Bem, ele deve ter entendido que a ofensa revela a falta de paz que há na alma do ofensor".

    De certo que, sim.
    Este final dispensa delongas.
    👏👏👏👏👏❤🥰

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